terça-feira, 16 de março de 2010

Mensagem de Bento XVI para as JMJ 2010


“Bom mestre, que devo fazer
para alcançar a vida eterna? (Mc 10,17)

Caros amigos, ocorre este ano o vigésimo quinto aniversário da instituição da
Jornada Mundial da Juventude, querida pelo Venerável João Paulo II como
encontro anual dos jovens crentes do mundo inteiro. Foi uma iniciativa
profética que deu frutos abundantes, permitindo às novas gerações cristãs
encontrar-se, pôr-se à escuta da Palavra de Deus, de descobrir a beleza da
Igreja e de viver experiências fortes de fé que levaram muitos à decisão de
entregar-se totalmente a Cristo.

A presente XXV Jornada representa uma etapa no caminho para o
próximo Encontro Mundial dos jovens, que terá lugar em Madrid em Agosto
de 2011, onde espero que sereis muitos a viver este acontecimento da
graça.

Para vos preparardes a tal celebração, quero propor-vos algumas
reflexões sobre o tema deste ano: “Bom Mestre, que devo fazer para alcançar
a vida eterna?” (Mc 10,17), excerto da cena evangélica do encontro de Jesus
com o jovem rico; um tema já desenvolvido, em 1985, pelo Papa João Paulo
II numa belíssima Carta, pela primeira vez dirigida explicitamente aos
jovens.

1. Jesus encontra um jovem

“Enquanto [Jesus] andava pelo caminho, – narra o Evangelho de São
Marcos – um certo jovem saiu-lhe ao encontro e, lançando-se de joelhos diante
dele, perguntou-lhe: «Bom Mestre, que devo fazer para ter em herança a a
vida eterna?». Jesus respondeu-lhe: «Porque me chamas Bom? Ninguém é bom
senão Deus. Tu conheces os mandamentos: Não matar, não cometer adultério,
não roubar, não dar falso testemunho, não cometas fraudes, honra pai e
mãe». Ele, então, disse-lhe: «Mestre, todas estas coisas tenho-as observado
desde a minha juventude». Então Jesus fixou nele o olhar, amou-o e disse-lhe:

«Uma coisa só te falta: vai, vende o que tens e dá-o aos pobres, e terás um
tesouro no céu; depois, vem e segue-me!». Mas a estas palavras ele ficou
pesaroso e retirou-se entristecido porque tinha muitos bens” (Mc 10, 17-22).

Este relato exprime de forma eficaz a grande atenção de Jesus para
com os jovens, sobre eles, sobre as vossas expectativas, as vossas
esperanças, e mostra bem como é grande o seu desejo de encontrar-vos
pessoalmente e de estabelecer um diálogo com cada um de vós. Cristo, de
facto, interrompe o seu caminho para responder à pergunta do seu
interlucotor, manifestando plena disponibilidade para aquele jovem, que é
movido por um ardente desejo de falar com o «Bom mestre», para aprender
d’Ele a percorrer o caminho da vida. Com este trecho evangélico, o meu
Predecessor queria exortar cada um de vós a “desenvolver um diálogo
próprio com Cristo – um diálogo que é de uma importância fundamental e
essencial para um jovem” (Carta aos Jovens, n. 2).

2. Jesus olhou-o e amou-o

No relato evangélico, São Marcos sublinha como “Jesus fixou nele o
olhar e amou-o” (cfr. Mc 10,21). No olhar do Senhor está o coração deste
encontro tão especial e mesmo de toda a experiência cristã. De facto, o
cristianismo não é, em primeiro lugar, uma moral, mas antes a experiência
de Jesus Cristo, que nos ama pessoalmente, jovens ou velhos, pobres ou
ricos; nos ama mesmo quando lhe viramos as costas.

Comentando a cena, o Papa João Paulo II acrescentava, dirigindo-se
a vós, jovens: “Desejo-vos que experimenteis um olhar assim! Desejo-vos a
experiência de que Ele, o Cristo, verdadeiramente vos olha com amor!”

(Carta aos Jovens, n. 7). Um amor, manifestado sobre a Cruz de um modo
tão pleno e total, que faz São Paulo escrever com assombro: “Amou-me e
entregou-se por mim!” (Gl 2,20). “A consciência de que o Pai nos ama desde
sempre no seu Filho, de que Cristo ama cada um e sempre – escreve ainda
o Papa João Paulo II -, converte-se num ponto firme de apoio para toda a
nossa existência humana” (Carta aos Jovens, n. 7), e permite-nos superar
todas as provas: a descoberta dos nossos pecados, o sofrimento, o
desânimo.

Neste amor encontra-se a fonte de toda a vida cristã e a razão
fundamental da evangelização: se verdadeiramente encontrámos Jesus,
não podemos fazer menos do que testemunhá-lo àqueles que não se
cruzaram ainda com o seu olhar!

3. A descoberta do projecto de vida

No jovem do Evangelho, podemos entrever uma condição muito
semelhante à de cada um de nós. Também vós estais cheios de qualidades,
de energias, de sonhos, de esperanças: recursos que possuis em
abundância! Mesmo a vossa idade constitui uma grande riqueza não
apenas para vós, mas também para os outros, para a Igreja e para o
mundo.

O jovem rico pergunta a Jesus: “O que devo fazer?”. A estação da vida
em que estais imersos é tempo de descoberta: dos dons que Deus vos
concedeu e da vossa responsabilidade. E ainda é tempo de escolhas
fundamentais para construir o vosso projecto de vida. Por isso, é o
momento de interrogar-vos sobre o sentido autêntico da existência e de
perguntar-vos: “Estou satisfeito com a minha vida? Falta-me alguma
coisa?”.

Como o jovem do Evangelho, talvez também vós viveis situações de
instabilidade, de confusão ou sofrimento, que vos levam a aspirar a uma
una vida não medíocre e a interrogar-vos: em que consiste uma vida de
sucesso? O que devo fazer? Qual pode ser o meu projecto de vida? “O que
devo fazer para que a minha vida tenha pleno valor e pleno sentido?” (Ibid.,
n. 3).

Não tenhais medo de enfrentar estas perguntas! Longe de oprimir-vos,
elas exprimem as grandes aspirações que estão presentes no vosso
coração. Portanto, que sejam atendidas. Elas reclamam respostas não
superficiais, mas capazes de satisfazer as vossas autênticas expectativas
de vida e de felicidade.

Para descobrir o projecto de vida que vos pode fazer plenamente
felizes, ponde-vos à escuta de Deus, que tem um desígnio de amor sobre
cada um de vós. Com confiança, pedi-lhe: “Senhor, qual é o teu projecto de
Criador e Pai sobre a minha vida? Qual é a tua vontade? Eu desejo cumpri-la”.

Estai certos de que vos responderá. Não tenhais medo da sua resposta!
“Deus é maior que o nosso coração e conhece todas as coisas” (1Jo 3,20)!

4. Vem e segue-me!

Jesus convida o jovem rico a caminhar além da satisfação das suas
aspirações e dos seus projectos pessoais, diz-lhe: “Vem e segue-me!”. A
vocação cristã brota de uma proposta de amor do Senhor e pode realizar-se
apenas graças a uma resposta de amor: “Jesus convida os seus discípulos
ao dom total da sua vida, sem cálculos e contrapartidas humanas, com
uma confiança sem reservas em Deus. Os santos acolhem este convite
exigente e colocam-se com humilde docilidade no seguimento de Cristo
crucificado e ressuscitado. A sua perfeição na lógica da fé, às vezes
humanamente incompreensível, consiste em não colocar-se a si mesmos no
centro mas em escolher seguir contra a corrente, vivendo segundo o
Evangelho” (Bento XVI, Homilia por ocasião das Canonizações: L’Osservatore
Romano, 12-13 de Outubro 2009, p. 6).

Sob o exemplo de tantos discípulos de Cristo, também vós, caros
amigos, acolhei com alegria o convite ao seguimento, para viver
intensamente e com frutos neste mundo. De facto, no Baptismo Ele chama
cada um a segui-lo com acções concretas, a amá-lo acima de todas as
coisas e a servi-lo nos irmãos. O jovem rico, infelizmente, não acolhe o
convite de Jesus e foi-se embora contristado. Não teve a coragem de
distanciar-se dos bens materiais para encontrar o bem maior proposto por
Jesus.

A tristeza do jovem rico do Evangelho é aquela que nasce no coração
de cada um quando não se tem a coragem de seguir Cristo, de fazer a
escolha certa. Mas nunca é tarde de mais para responder-lhe!
Jesus nunca se cansa de voltar o seu olhar de amor e chamar a ser
seus discípulos, mas Ele propõe a alguns uma escolha ainda mais radical.
Neste Ano Sacerdotal, queria exortar os jovens e os adolescentes a estar
atentos por se o Senhor os convida a um dom maior, no caminho do
Sacerdócio ministerial, e a tornar-se disponíveis a acolher com
generosidade e entusiasmo este sinal de especial predilecção, iniciando
com um sacerdote, com o director espiritual o necessário caminho de
discernimento. Não tenhais medo, pois, caros e caras jovens, se o Senhor
vos chama à vida religiosa, monástica, missionária ou de especial
consagração: Ele sabe dar alegria profunda a quem responde com coragem!

Convida, ainda, a quantos sentem a vocação ao matrimónio a acolhê-la
com fé, empenhando-se a pôr alicerces sólidos para viver um amor
grande, fiel e aberto ao dom da vida, que é riqueza e graça para a
sociedade e para a Igreja.

5. Orientados para a vida eterna

“O que devo fazer para ter em herança a vida eterna?”. Esta pergunta
do jovem do Evangelho parece longínqua das preocupações de muitos
jovens contemporâneos, pois, como observava o meu Predecessor, “não
somos nós a geração a quem o mundo e o progresso temporal enchem
completamente o horizonte da existência?” (Carta aos jovens, n. 5). Mas a
pergunta sobre a “vida eterna” surge em momentos particularmente
dolorosos da existência, quando sofremos a perda de uma pessoa querida
ou quando vivemos a experiência do fracasso.

Mas o que é a “vida eterna” a que se refere o jovem rico? Isso explica-o
Jesus, quando, dirigindo-se aos seus discípulos, afirma: “Virei de novo a
vós e o vosso coração encher-se-á de alegria e ninguém vos poderá tirar a
vossa alegria” (Jo 16,22). São palavras que indicam uma proposta exaltante
de felicidade sem fim, de alegria por ser possuídos do amor divino para
sempre.

Interrogar-se sobre o futuro definitivo que espera a cada um de nós,
confere um sentido pleno à existência, pois orienta o projecto de vida para
horizontes não limitados e passageiros, mas amplos e profundos, que
levam a amar o mundo, ele mesmo amado por Deus, a dedicar-se ao seu
desenvolvimento, mas sempre com a liberdade e a alegria que nascem da fé
e da esperança. São horizontes que ajudam a não absolutizar as realidades
terrenas, sentindo que Deus nos reserva uma perspectiva maior, e a repetir
com Santo Agostinho: “Desejamos juntos a pátria celeste, suspiramos pela
pátria celeste, sinta-mo-nos peregrinos aqui” (Comentário ao Evangelho de
São João, Homilia 35, 9). Tendo o olhar fixo na vida eterna, o Beato Pier
Giorgio Frassati, que morreu em 1925 na idade de 24 anos, dizia: “Quero
viver e não sobreviver!” e na fotografia de uma escalada, enviada a um
amigo, escrevia assim: “Para o alto”, fazendo referência à perfeição cristã,
mas também à vida eterna.

Caros jovens, exorto-vos a não esquecer esta perspectiva no vosso
projecto de vida: somos chamados à eternidade. Deus criou-nos para estar
com Ele para sempre. Ela ajudar-vos-á a dar um sentido pleno às vossas
escolhas e a dar qualidade à vossa existência.

6. Os mandamentos, caminho do amor autêntico

Jesus recorda ao jovem rico os dez mandamentos como condições
necessárias para “ter em herança a vida eterna”. Eles são pontos de
referência essenciais para viver no amor, para distinguir claramente o bem
do mal e construir um projecto de vida sólido e duradouro. Também a vós,
Jesus pergunta se conheceis os mandamentos, se vos preocupais de
formar a vossa consciência segundo a lei divina e se os pondes em prática.

É verdade que se trata de exigências contra a corrente com respeito à
mentalidade actual, que propõe uma liberdade separada dos valores, das
regras, das normas objectivas e que convida a rejeitar qualquer limite aos
desejos do momento. Mas este tipo de proposta em vez de conduzir à
verdadeira liberdade, leva o homem a tornar-se escravo de si mesmo, dos
seus desejos imediatos, dos ídolos como o poder, o dinheiro, o prazer
desenfreado e as seduções do mundo, tornando-o incapaz de seguir a sua
natural vocação ao amor.

Deus dá-nos os mandamentos porque nos educar para a verdadeira
liberdade, porque quer construir connosco um Reino de amor, de justiça e
de paz. Escutá-los e -los em prática não significa alienar-se, mas
encontrar o caminho da liberdade e do amor autênticos, porque os
mandamentos não limitam a felicidade, mas indicam como encontrá-la.
Jesus, ao iniciar o diálogo com o jovem rico, recorda que a lei dada por
Deus é boa, porque “Deus é bom”.

7. Precisamos de vós

Quem vive hoje a condição juvenil tem de enfrentar muitos problemas
derivados da desocupação, da falta de referências ideais certas e de
perspectivas concretas para o futuro. Às vezes, tem-se a impressão de ser
impotentes diante das crises e desnortes actuais. Apesar das dificuldades,
não vos deixeis desanimar e não renuncieis aos vossos sonhos! Pelo
contrário, cultivai no coração desejos grandes de fraternidade, de justiça e
de paz. O futuro está nas mãos de quem sabe procurar e encontrar razões
fortes de vida e de esperança. Se quiserdes, o futuro está nas vossas mãos,
porque os dons e as riquezas que o Senhor colocou no coração de cada um
de vós, plasmados no encontro com Cristo, podem trazer autêntica
esperança ao mundo! É a fé no seu amor que, tornando-vos fortes e
generosos, vos dará a coragem de enfrentar com serenidade o caminho da
vida e assumir responsabilidades familiares e profissionais. Empenhai-vos
em construir o vosso futuro através de itinerários sérios de formação
pessoal e de estudo, para servir de modo competente e generoso o bem
comum.

Na minha recente Carta encíclica sobre o desenvolvimento humano
integral, Caritas in veritate, mencionei alguns dos grandes desafios actuais,
que são urgentes e essenciais para a vida deste mundo: o uso dos recursos
da terra e o respeito pela ecologia, a justa divisão dos bens e o controlo dos
mecanismos financeiros, a solidariedade com os Países pobres no âmbito
da família humana, a luta contra a fome no mundo, a promoção da
dignidade do trabalho humano, o serviço à cultura da vida, a construção
da paz entre os povos, o diálogo inter-religioso, o bom uso dos meios de
comunicação social.

São desafios aos quais sois chamados a responder para construir um
mundo mais justo e mais fraterno. São desafios que reclamam um projecto
de vida exigente e apaixonante, onde colocar toda a vossa riqueza segundo
o desígnio que Deus tem para cada um de vós. Não se trata de fazer gestos
heróicos nem extraordinários, mas de agir pondo a render os próprios
talentos e as próprias possibilidades, empenhando-se em progredir
constantemente na fé e no amor.

Neste Ano Sacerdotal, convido-vos a conhecer a vida dos santos,
particularmente a dos santos sacerdotes. Vereis que Deus guiou-os e eles
encontraram o seu caminho dia após dia, precisamente na fé, na
esperança e no amor. Cristo chama cada um de vós a empenhar-se com
Ele e a assumir a própria responsabilidade em construir e a civilização do
amor. Se seguirdes a sua Palavra, também a vossa vida será iluminada e
vos conduzirá a metas altas, que dão alegria e sentido pleno à vida.
Que a Virgem Maria, Mãe da Igreja, vos acompanhe com a sua
protecção. Asseguro-vos que vos recordo na minha oração e com muito
afecto vos abençoo.

Do Vaticano, 22 de Fevereiro de 2010

Tradução do Departamento Nacional da Pastoral Juvenil – Portugal.

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